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Relatos   Oficina com Priscilla Pontes

Arvorando

Texto: Sol do Rosário

 

Quando fui no rio e escorreguei na pedra vi realmente o quanto a pedra é lisa, escorregadia e lembrei da música que a Priscilla Pontes canta na oficina: “Maria vai atravessar o rio, pegar na mão do Zé pra não escorregar...”

Arvorando vejo como uma árvore, a semente que foi plantada há anos começou pelo Pontes Móveis, mas o meu interesse veio mesmo quando vi a peça de teatro “Macumba”.

Quero fazer dança Afro!

Me ajuda a enraizar, pois sou muito ar, pés no chão, cada dança e movimento não é em vão,

tem um sentido, um porquê.

 

O olhar, a memória.

Arvorando

Eu sou a árvore Pés, minha raiz Corpo, tronco

Braços, mãos, galhos

Cabelo, as folhas, os frutos

 

É ancestral, resgate e memórias; é não deixar morrer e sim florescer, espalhar as sementes.

Tem o aquecimento que faz com que o corpo desperte; é você olhar pra si, o tocar, o sentir

as mãos, os braços, o corpo, a pele, os ossos.

Em círculo, é o olhar para o outro também ao dizer seu nome, se apresentando e com um movimento é o se emponderar, é você se ouvir e ouvir o outro.

Sol: fazendo o movimento com uma das mãos fechada pegando o trigo

Do Rosário: é o cortar com a outra mão fazendo o movimento do corte da foice, a colheita.

O saudar : Amor, carinho, respeito e ancestralidade (da rainha Vânia de Oliveira, onde a Priscilla Pontes traz nas suas oficinas).

Então na dança Afro também tem o plantar e o colher, o saudar e o celebrar. Você vai entendendo que não é fazer o movimento por fazer, Priscilla Pontes fez uma pesquisa onde passa para nós este conhecimento.

Eu como atriz sinto parte também desta pesquisa, desta investigação comigo mesma e onde empregar todo esse aprendizado em uma cena, no palco e comigo mesma.

Como era meu corpo, antes e agora?

Como as pessoas que estão de fora, me veem?

Pra mim esta conscientização do meu corpo, comigo mesma é muito importante e faz a diferença.

Além também de trabalhar a memória, não só mental, mas corporal também.

Quando se passa uma coreografia, preciso trabalhar em mim de não me preocupar com o outro, digo olhar para os lados, o colar. É preciso aprender a memorizar olhar para mim mesma, focar, confiar. A visão periférica!

Mas não esquecer que não estou sozinha tem outras pessoas comigo dançando, é um coletivo, lembrei agora dos pássaros, do voo deles.

O improviso gosto porque tudo que se aprendeu você pode colocar em prática podendo criar e até aprimorar.

Não esquecer da música, o canto que faz parte, onde você também pode ser a compositora. Você sempre está criando e se surpreende com você mesma.

Sempre tem um movimento que você gosta mais e cada movimento sua história, lugar e vem também com a energia dos orixás e os elementos da natureza. E tudo vai se encaminhando para algum lugar.

A Priscilla também nos conta a história da dança Afro.

A dança que me fez aterrar mais, confiar mais em mim e a entender que cada corpo é um corpo, meu corpo é diferente do outro, mas que é possível sim dançar respeitando seus limites.

E quando você vê que é possível dançar, celebrar a partir da dança, sua alma vibra de alegria querendo mais e mais. Você pensa não vou conseguir dançar tanto tempo, mas com o tempo você se surpreende e vê que consegue, pois vai praticando meses, que seu corpo acostuma, onde também ajuda você a ter disposição, se sustentar, se manter do começo ao fim.

A cada dia você vai se aprimorando para o trabalho de atriz e até para a vida e saúde.

A música sempre está presente, seja cantada, ouvida ou pela percussão, vejo como o tempero para a dança, a cada toque dos tambores, o movimento, a comunicação.

E nesta oficina, nesta pesquisa Priscilla Pontes perguntou:

Que tipo de água você é?

Do rio, do mar, da chuva, riacho... realmente faz a gente refletir.

E Eu lhe pergunto: Que água você quer ser? Água parada, seca ou cheira mal.

Água é movimento, dança é movimento.

“Tá vendo esse rio que corre pro meio do mar? Ele vem lá de longe não houve barreiras para lhe segurar” (música composição de Priscilla Pontes cantada na oficina).

Eu quero ser o RIO!

Eu sou o Rio calmo e tranquilo, mas podendo ser a força da queda da água formando uma cachoeira, as águas que se encontram.

Ao escrever este texto trago as memórias da vivência da oficina de dança afro da Priscilla Pontes.

Vejo em mim Sol do Rosário, Flávia Imirene, Sabrina Marques, Priscilla Pontes e outras mulheres que cada uma é um tipo de água que vem de algum lugar, se encontram, se cruzam, transformam e seguem em frente em busca de novas águas.

Relatos   Oficina com Kunta Leonardo da Cruz

“Pra onde esta estrada me leva , pra onde esta estrada vai, eu vou descendo a ladeira, ladeira que nunca acaba”

Texto: Sol do Rosário

 

Na oficina do Kunta tem a estrada, que percorremos, pra chegar no Quilombo Paiol de Telhas, e a estrada que nos levou até o rio, o caminhar na estrada de chão e escorregar nas pequenas pedras e quase cair, o olhar, o coletivo, o ficar descalço e andar na terra, na mata, nas pedras, o se abaixar pra atravessar o arame, o sentir as pedras nos seus pés, a água gelada, os movimentos que foram feitos em uma sala, foi colocado em prática lá fora na natureza, na pedra, o pisar, abrir os pés fazer o movimento repetitivo, onde acaba surgindo novos movimentos.

Na travessia meu movimento foi a flecha, andando bem devagar, a flecha que me guia para algum lugar, meu alvo perto. Em outros encontros foram explorados mais as flechas, direções perto, longe, curta, pequena, alto, pular. A mata, a caça, Oxóssi só tem uma flecha é preciso acertar, por isso a importância de saber o que você quer, quer acertar o que, qual seu objetivo? Gostei do movimento que se puxa a flecha, a força, a energia, nos braços, mas não esquecer do alvo.

O que você quer acertar? É preciso silêncio, ficar a espreita para caçar.

A mata, a caça, a travessia da mata, do rio, das pedras, o olhar.Peço licença para entrar na mata, fazer a travessia. Me veio a memória que muitos entram na mata e não voltam, assim contam os avôs.

​Sempre é lembrado os pés, sentir calcanhar, abrir os dedos dos pés, é o chão, o aterrar, ter a conscientização de como você tá pisando, andando pra te dar segurança e precisão em cada movimento a esta travessia.​

Oxóssi também é compartilhar o que caçou, é abundância, é fartura, festejar, fortalecer vínculos. Quando voltamos do rio teve a subida, mas teve a chegada com a mesa farta reunindo as pessoas a sua volta.Foi momento também de colocar em prática os movimentos e criar, tudo o que vivemos ficou na memória do meu corpo e mente.

 

Dentro do paiol

No chão fico de forma fetal, o corpo encolhido, acolhimento seguro, me sinto segura, aos poucos vou nascendo pro mundo, mãos, toco minhas mãos, braços, pernas, corpo, toco meu rosto, cabelo e vou crescendo, me fortalecendo, tocando firme no meu corpo, a força, levanto, calma, ando devagar, mas vou pro mundo andando, mais firme, acelerada, tenho pressa, mas minhas mãos seguram algo do lado, tirei e firme, como se fosse uma bolsa, meu escudo, uma proteção e ando firme confiante e segura.​

Meu rosto se transforma fica com expressão séria, carregada, o corpo também fica pesado, como se o tempo tivesse passado, carregando o tempo, a idade, a vivência.

Rosário não é mais aquela menina é uma mulher marcada pelo seu tempo, está em cada olhar, gesto, palavra, corpo, rosto, carinho.​

Ela segue em frente, mas sua alma carrega uma história de anos, uma vida vivida, de mãe Umbelina, pai João, irmãos, filhos que nasceram e se foi e ficou memórias e saudades de Rosário.

 

Onde a água flui de um lado para outro, pra lá e pra cá, as mãos tocam na água, direita e esquerda, passado, eu presente, futuro e em ciclos a cada movimento, ciclos, começo, meio e fim. A roda, mas tendo o movimento, as emoções, mas olho pra baixo, olho pro chão, pra água, pra não esquecer de onde eu vim.​Das minhas histórias, memórias e emoções para não esquecer de minhas raízes e de onde vim.

 

Kunta pergunta Quem é Tereza de Benguela pra vocês?

Tereza de Benguela é minha mãe Maria do Carmo Rosário.

Uma mulher que abriu caminhos de onde mora, sem luz, mas tinha o lampião, a água do poço e banho de bacia.

Trabalhadeira, sustentando os filhos, negra, cabelos grisalhos, anda devagar, mas muito ativa no seu dia a dia, quando o almoço tá pronto me grita de longe chamando para o almoço, gosta de contar suas histórias e memórias de quando era criança no café da manhã.Quando ia trabalhar e pegava ônibus de manhã, já entra dizendo “Bom dia” ao motorista e aos passageiros, bem alto, e rindo, e contando suas piadas, por mais que por dentro a vontade era de chorar.​

 

A vivência com o fogo. O fogo que queima, também transforma, mas é preciso alimentá-lo e cada um tem a sua maneira de manter o fogo aceso, a alimentar o espírito.A oficina que entramos de um jeito e saímos de outro. Não chorei de tristeza e sim de alegria pois algo que estava adormecido despertou em mim.

Relatos   Oficina com Contramestre André

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